sábado, 18 de julho de 2009

Só a tecnologia pode evitar a fome mundial


A previsão do pensador inglês Thomas Malthus, que projetava há 200 anos um crescimento populacional em proporção geométrica, enquanto a produção de alimentos aumentaria em proporção aritmética, caiu em descrédito com a impressionante evolução da produtividade agrícola no século 20.

Hoje, no entanto, o fantasma da fome volta a assombrar o mundo, por conta do grande aumento da demanda por alimentos, principalmente em países asiáticos de grande concentração populacional, que experimentam um salto em qualidade de vida e consumo. Acrescente-se o aumento de preços das commodities agrícolas e a alta dos preços de combustíveis, e temos um cenário preocupante.

Os produtos que mais subiram de preço nos últimos anos foram arroz, milho, soja e trigo, justamente os mais consumidos como alimentação básica. O redirecionamento da produção do milho nos EUA para produção de etanol também concorre para ampliar as dificuldades de abastecimento de alimentos, comprometendo toda a cadeia produtiva, porque o milho, grão mais consumido no mundo, compõe também a ração animal e grande parte dos alimentos industrializados.

Uma nova realidade, a dos alimentos caros, preocupa a humanidade, atualmente com 6,7 bilhões de pessoas, a maioria com hábitos de consumo ampliados. A crescente demanda exige um expressivo aumento de produção. Os investimentos concentrados em alta tecnologia são a melhor alternativa para ampliar a produção.

Limitada pela geografia, pelo clima, disponibilidade de água, estrutura fundiária e outros fatores, a expansão agrícola mundial depende em muito da tecnologia para atender à demanda atual e futura por alimentos.

O mundo olha com atenção para os campos agrícolas brasileiros em razão da sua competitividade quase sem concorrência. Um dos grandes países em produtividade e emprego de alta tecnologia, o Brasil possui uma série de vantagens naturais, como clima favorável, água e terras em abundância para a utilização agrícola. O país é líder mundial de exportação de açúcar, café, suco de laranja e soja.

O Brasil - país com a maior fronteira agrícola do mundo - mais que dobrou a produção de grãos nos últimos 30 anos, chegando ao recorde projetado de 143,7 milhões de toneladas (Conab) a 145,1 milhões (IBGE) na safra 2007/2008. O País possui ainda 133 milhões de hectares ainda não explorados ou usados para a criação de animais, sem tocar na região Amazônica.

A produtividade é a principal responsável por esse crescimento, que não foi acompanhado pelo respectivo aumento da área plantada. Os investimentos em tecnologia elevaram a produtividade das lavouras de soja em 10% e de milho em 20,5% nas últimas três safras no Brasil.

O Brasil está marcado para ser uma das grandes potências mundiais do agronegócio. A atual posição do país no mercado agrícola mundial deve-se, essencialmente, à capacidade empreendedora dos agricultores. A grande evolução tecnológica e de produtividade obtida nas últimas décadas representa uma das mais bem-sucedidas histórias de empreendedorismo do capitalismo brasileiro.

Nenhum outro país do mundo tem potencial de desenvolvimento agrícola tão grande quanto o brasileiro. São as conhecidas deficiências do Brasil, principalmente de infra-estrutura, o maior entrave para retardar sua consolidação como maior produtor de alimentos do mundo.

Outras dificuldades são superáveis pela mudança de cultura. São necessários maior profissionalização, melhor organização, estudos de logística e aplicação de técnicas de alta tecnologia para alavancar o ciclo de expansão da agricultura, que deve perdurar até 2015.

O setor agrícola, responsável em grande parte pela evolução da economia nos últimos anos, está recebendo, em uma providência oportuna do governo, aporte de recursos da ordem de US$ 6 bilhões para financiamento da produção da próxima safra. São recursos destinados, principalmente, aos investimentos em equipamentos e tecnologia.

É preciso investir em produção de escala para ganhar competitividade. Uma revolução técnica permitiu a ocupação do Cerrado com uma expansão agrícola que representa o fenômeno mais importante da agricultura brasileira. Foi o primeiro grande movimento para transformar o Brasil em um dos maiores mercados de agroquímicos do mundo.

O ciclo agrícola do Cerrado ainda não se encerrou. A tecnologia resolveu os problemas de acidez e de baixa fertilidade das terras de cerrado, que se tornou mais apto devido, também, à descoberta de novas variedades de sementes (o exemplo mais notável tendo sido a soja), sem falar na melhoria genética e em outros resultados da pesquisa na região.

A agricultura brasileira teria ficado limitada às regiões Sul e Sudeste, em face das graves limitações de uso da terra nas regiões Norte e Nordeste, sem a expansão agrícola do cerrado. O movimento tem sido criticado em função do predomínio da produção em grande escala, altamente mecanizada, com pequeno espaço para a agricultura familiar e uma absorção muito pequena da mão de obra agrícola de baixa qualificação. Esse modelo, no entanto, é fundamental para ampliar a produção e atender à demanda com competitividade.

A concentração do mercado em grandes produtores é um fenômeno mundial. Os dados dos Estados Unidos e da Europa que mostram que lá acontece a mesma coisa: um número grande de pequenos produtores sai da atividade, arrenda a terra ou parte para culturas mais intensivas, em movimento semelhante ao que acontece em outros setores econômicos..

O próprio fenômeno da migração para o cerrado começou desta forma: produtores do Sul que tinham 50 hectares, passaram a comprar 500 a 1 mil hectares no cerrado. É uma consolidação da produção em escala, característica do mercado de commodities.

O campo vem reagindo para ampliar a oferta de alimentos há mais tempo do que se imagina. Os investimentos em tecnologia são muito altos na cultura da soja, mas ainda há muito espaço para crescer na produção de milho. Existe ainda um longo caminho a ser percorrido em termos de uso de variedades e de aplicação de defensivos e fertilizantes. A velocidade das economias emergentes tem sido rápida e o consumo de alimentos segue o mesmo ritmo.

O agricultor brasileiro investe significativamente em tecnologia para ampliar a produção de alimentos. Ninguém produz soja com tanta eficiência quanto os produtores brasileiros. Soja e milho estão entre as culturas que registram aumentos sucessivos no uso de defensivos mais eficientes no controle de pragas e doenças nas últimas safras.

Mas pode ser melhorado. Dos 13 milhões de hectares cultivados com milho, cerca de 4 milhões de hectares são áreas de muito baixa tecnologia, que entram nos dados oficiais e puxam a média de produtividade do Brasil para baixo. Nos produtores de ponta, a colheita supera 8 mil quilos por hectare, equivalente ao que produzem os Estados Unidos. Temos o mesmo potencial de crescimento, mas o alto nível de produtividade ainda não é o padrão.

Portanto, o mercado que investe em insumos do milho gira em torno de 9 milhões de hectares. Destes, uns 30% correspondem a alto investimento. Um fenômeno muito interessante é a evolução da safrinha: quando começou no Brasil, ela praticamente não existia e tinha baixo nível de produtividade muito menor do que a safra verão. Hoje, a área de quase 3 milhões de hectares conta com alto nível de investimento em tecnologia.

O aumento da produtividade passa necessariamente pelo aumento de consumo de defensivos, e o produtor deve ser conscientizado sobre os benefícios. A utilização de defensivos no Brasil ainda é baixa em comparação com o resto do mundo, e a demanda para controle de doença, praga e erva daninha é muito maior por tratar-se de área tropical.

A produtividade média da soja no Brasil cresceu 10,3% e o número de aplicações de defensivos aumentou 5,3% nas três últimas safras, conforme pesquisa realizada pela Kleffmann. Impulsionado pelo uso de produtos mais modernos, o investimento em produção - dólar/hectare (US$/ha) - também foi ampliado, chegando a 31,2% nas três últimas safras.

Esse resultado demonstra que o Brasil consolidou sua posição entre os mais importantes mercados de agroquímicos do mundo. Prova disso é que, ano após ano, o agricultor passou a lutar para reduzir as perdas na lavoura, modificando a linha dos produtos que utilizava e adotando o tratamento de sementes para garantir maior produtividade.

Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso registraram aumento da produtividade média no período das três safras, chegando a 3,4 toneladas por hectare no Mato Grosso contra a média nacional de 3,1 toneladas por hectare. Além do evidente aumento de tecnologia, as condições climáticas também foram favoráveis.

Os dados integram o maior levantamento de informações do setor agrícola do mundo. Trata-se de uma pesquisa realizada desde 1998 para acompanhamento da evolução de mercado, por meio de repetição amostral periódica. O levantamento realizado junto a produtores aponta que o produtor não só aumentou o número de vezes que aplicou, como também ampliou o mix de produtos.

Na região Sul do Brasil, o investimento por hectare cresceu 47%, com os produtores utilizando misturas mais modernas. A pesquisa mostrou também que produtos com maior tecnologia, que atuam de forma diferente dos tradicionais, praticamente dobraram seu mercado nas últimas safras.

Existem ainda outras novas tecnologias disponíveis: os transgênicos; o plantio direto, que vem crescendo significativamente; o uso de sementes geneticamente melhoradas; e a tecnologia de tratamento de sementes, que não existia antes. A biotecnologia é uma grande aliada não só em termos de produtividade, mas também para reduzir impactos ambientais. No segmento específico de defensivos, existe um investimento grande em fungicida e do uso de inseticidas mais modernos, que têm um impacto menor no meio ambiente.

A soja sempre foi o principal mercado de defensivos no Brasil como é para fertilizantes e máquinas. As sementes de soja são tratadas não apenas com fungicidas, mas também com inseticidas. Além disso, no caso do milho, os agricultores já adotam, em 20% da área, o fungicida foliar. O fungicida, que sempre teve importância menor no Brasil, passou a ter importância maior. E isso agora está migrando para outras culturas, crescendo no mercado de algodão e milho. Hoje o mercado de fungicida tem praticamente o peso que o de herbicidas.

O glifosato, defensivo mais vendido no mundo, é usado em praticamente toda a área de milho e soja, mas também registra um consumo crescente no algodão. O consumo deste produto no Brasil cresce amarrado à rápida expansão do uso de tecnologia transgênica, que já representa cerca de metade do mercado.

Outra limitação para expansão da produção agrícola no mundo todo são as extensas áreas de pastagens da pecuária, onde o Brasil também se destaca como um dos maiores produtores. O pecuarista tem restrições com a tecnologia e a adoção é baixa por uma questão cultural: coloca muito mais atenção em boi, que em pasto. Não usa corretamente os produtos na melhoria da qualidade da pastagem, o que permitiria produzir mais com melhor qualidade em áreas menores.

A ocupação de grandes áreas para plantio de cana-de-açúcar destinada à produção de etanol também é apontada como fator de limitação para a expansão do plantio de alimentos. Estudos revelam, no entanto, que o crescimento desse setor está desacelerando por conta da conjuntura econômica. O Brasil explora muito bem esse segmento, com uso de altas tecnologias e produtividade, o que não acontece com a fruticultura, por exemplo, onde o desempenho é muito inferior a países como Chile.

Os discípulos de Malthus, portanto, terão que esperar, talvez, mais dois séculos para verem a teoria da fome mundial vingar. A ciência provou que é capaz de dar respostas aos problemas históricos do setor agrícola, e deve provar também nos próximos anos. No caso dos defensivos, a opção do produtor é investir, porque o mercado exige competitividade. Ele pode até administrar o produto de acordo com sua necessidade, mas não pode desprezar a tecnologia.